Bianca Cirilo
> A desumanização no meio espírita
De início, parece um contrassenso
o título deste artigo, afinal, haveria desumanização
no meio espírita? Quando se trata de comportamento humano é
preciso considerar que estamos falando de espíritos em complexos
processos de reencarnação, logo, de aprendizado constante.
Desta forma, nosso objetivo está em tão somente alertar
a nós mesmos sobre a importância de acionarmos nosso
senso de vigilância, conforme nos convidou Jesus, acerca de
sentimentos e ações não condizentes com o amor
ao próximo.
Ainda persiste no meio espírita um sentimento conflitante entre
a pressa de evoluir e a acomodação que adia a reforma
íntima, gerando perturbações psicológicas
significativas. Isso retrata, pois, de um lado, uma crença
equivocada de autocobrança e expectativa de que sintamos e
nos comportemos de maneira totalmente angelical, absolutamente condescendente
e tolerante como se já fôssemos seres evoluídos
e não almas alunas de Deus, no esforço contínuo
do aperfeiçoamento e, de outro lado, uma tendência ao
adiamento da busca de melhoria, criando desculpas para acabar desistindo
de ser feliz e de crescer.
Por isso, é importante aprendermos a lidar com nossa humanidade,
fazer contato com isso, isto é, resgatar o sentido do amar
a si mesmo para podermos aprender a amar o outro. Ermance Dufaux dedica-se,
intensamente, a nos ensinar esse caminho de volta ao respeito e à
compreensão verdadeira do que seja amar-se, destacando que
o primeiro passo estaria em fazer as pazes com o homem velho que reside
em nós e que ainda insistimos em condenar ou em desculpar neuroticamente,
mediante fugas psicológicas de larga implicância negativa
em nossas vidas.
O aspecto da desumanização no meio espírita está
muito pautado nas distorções que o espírita,
em geral, tem feito sobre sua relação com a religiosidade
e com o processo intransferível de transformação
espiritual. Isso significa dizer, especificamente, que ainda estamos
muito condicionados a um processo educacional moral que vem de fora
para dentro, imantados pela lógica do terror religioso que
cobra, exige e que ameaça ao inferno das penas.
Comprovamos o exposto acima pela maneira como ainda nos tratamos e
tratamos os outros, ao julgarmos os companheiros de jornada espírita
de forma muito dura, sem considerar sua história pessoal e
suas lutas cotidianas, adotando atitudes preconceituosas, maledicentes
e criando uma expectativa de que muitos se comportem como julgamos
adequado e certo; o que nem mesmo conseguimos.
Em outras ocasiões, observamos queixas de companheiros que
adentram a primeira vez numa casa espírita e são tratados
de forma descortês, sem o devido cuidado com a dor e o momento
psicológico de quem está em sofrimento e em desalinho
com suas questões emocionais e particulares. Não se
quer, com isso, dizer que devamos ser coniventes com melindres; porém,
não podemos julgar as atitudes alheias, uma vez que nosso dever
como cristãos está em assistir, amparar na medida de
nossas possibilidades e não determinar como cada um deve agir.
Além disso, infelizmente, ainda é frequente o descaso
e a dificuldade de desenvolver empatia, devido a lamentáveis
processos de burocratização da caridade. Muitos de nós
confundem disciplina com institucionalização da rigidez.
Sermos disciplinados, auxiliarmos nossos irmãos através
da informação das normas de nossa casa espírita,
por exemplo, assim como dos trabalhos que ela oferece não significa
infantilizá-los ou tratá-los de forma fria e desumana,
como se a caridade fosse um mero protocolo de atendimento.
Jesus Cristo, nosso Mestre eterno do Amor, não burocratizou
o Bem, ajudou a todos que podia sem derrogar as Leis Divinas, sendo
firme quando era preciso, porém sempre amoroso, já que
o amor educa sem ferir, sem impor, sem gelar o coração.
Toda a obra de Ermance Dufaux nos auxilia nessa problemática
de resgate de nossa condição humana e para que nos espiritualizemos
precisamos passar por isso, ou seja, retomar nosso contato com aquilo
que nos faz filhos de Deus — nossa essência real —
que nos aproxima do que realmente nos faz bem à alma.
O medo do amor ainda é uma dificuldade secular que trazemos
arraigada em nosso íntimo, distorcendo nosso contato com o
que somos e como devemos evoluir segundo os preceitos do Cristo. Esse
processo tem gerado tamanho distanciamento com nossa real identidade.
Desta forma, acabamos por artificializar as relações,
presos à superficialidade e ao formalismo social, quando, na
verdade, o sentido de estarmos juntos é para aprendermos a
muito nos amar, tomando o exemplo de nosso grande Mestre dos mestres;
aquele que vai à frente em todos os tempos de nossa vida imortal.
Referências Bibliográficas:
KARDEC, A. Amar o próximo como
a si mesmo. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Cap. XI: 1-4. Rio de
Janeiro: Editora CELD, 2004. (pp 188-189).
OLIVEIRA, W. S. Emoções que Curam. Pelo Espírito
de Ermance Dufaux. Belo Horizonte: Editora Dufaux, 2013.
OLIVEIRA, W. S. Reforma Íntima sem Martírio. Pelo Espírito
de Ermance Dufaux. Belo Horizonte: Editora Dufaux, 2007.
Fonte: Revista
CELD de Estudos Espíritas
> https://celd.xyz/wp-content/uploads/10-Revista_CELD_Outubro_2017.pdf
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