Logo no início da palavra “maledicência”,
está presente o “mal”. A própria morfologia
nos alerta que o que se vai dizer está relacionado ao mal.
Desde tempos imemoriais, a maledicência e a intriga estiveram
presentes no cotidiano dos espíritos imperfeitos que transitam
pela Terra.
Na Idade Média, por exemplo, havia os trovadores que percorriam
os castelos, recitando poesias para o deleite da nobreza. Podiam ser
cantigas de amor ou cantigas de escárnio ou maldizer. Essas últimas
criticavam costumes morais ou políticos, chegando a ser bastante
vulgares.
Entretanto, todas as mensagens do Evangelho de Jesus podem ser resumidas
em dois mandamentos: amar a Deus sobre todas as coisas e amar ao próximo
como a si mesmo. Todas as virtudes derivam desses dois mandamentos e
os vícios ocorrem quando nos afastamos deles.
Pode parecer que amar significa algo muito grande, muito profundo, mas
o amor pode se manifestar em pequenos gestos, em pequenas atitudes.
Não viver criticando os outros já é um ato de amor.
O Amor é tolerante, não é exigente.
Com mais frequência do que o desejável, quando duas ou
mais pessoas estão batendo papo e o assunto é uma terceira
pessoa que não está presente, raramente trocam ideias;
é mais comum trocarem fofoca.
Por que isso acontece? Será que somos maus? Nem sempre. É
porque adquirimos o vício de comentar a vida alheia e os comentários,
em geral, são maldosos. Parece que é uma atração
irresistível focar nos defeitos dos outros.
As reuniões sociais são, em geral, academias de maledicência.
O que provoca a maledicência? Angariar simpatia do outro, como
se falar mal de uma terceira pessoa fizesse com que as duas ficassem
amigas. Não esqueça que se falam mal de alguém
com você, também falarão mal de você com outros.
Pior que isso, são os acréscimos, por conta da imaginação
doentia, nas interpretações malévolas que se faz.
Qual a razão última dessa mania de maledicência?
Pode ser um sentimento de inferioridade unido a um desejo de superioridade.
Diminuir o valor dos outros nos dá a grata ilusão de aumentar
o nosso próprio valor. As pessoas, na imensa maioria, não
estão em condições de medir seu valor por si mesmas.
Necessitam medir o seu próprio valor, desvalorizando os outros.
Precisamos examinar muito bem os nossos sentimentos, porque muitas vezes,
o que provoca a crítica ao próximo não passa de
despeito. Não é preciso apagar a luz do próximo
para a nossa própria brilhar. Contemplando o céu, vemos
que quando muitas estrelas brilham juntas produzem um espetáculo
muito mais bonito do que quando apenas uma está brilhando. Quem
tem luz própria, não precisa apagar a luz dos outros.
É muito mais grave quando a simples fofoca se transforma em calúnia,
injúria ou difamação. São crimes, que estão
codificados no Código Penal e nem nos damos conta da gravidade
que as nossas palavras podem ter.
Joanna de Ângelis, em “Reflexões sobre a Calúnia”,
no livro Liberta-te do Mal, diz:
“Toda vez que o indivíduo se sente ameaçado
em sua fortaleza de egoísmo pelos valores dignificantes do próximo
é dominado pela inveja e investe furibundo atacando aquele que
supõe ser seu adversário”.
O caluniador gera dificuldades no trabalho, criando desentendimentos
à sua volta, produzindo campanhas difamatórias A calúnia
é a arma poderosa de que se utilizam esses enfermos do espírito
e se vale da imperfeição daqueles que dão ouvidos
ao caluniador e propagam a falsidade.
A calunia arruína três pessoas: a si próprio, o
caluniado e o ouvinte. Portanto, faz dois culpados e uma vítima.
Em Os Mensageiros, André Luiz narra
o caso do caluniador Paulo e as gravíssimas consequências
da sua atitude no plano espiritual:
Em uma construção isolada em Nosso Lar
estavam espíritos enlouquecidos em tratamento e entre eles, Paulo,
o caluniador. Na tela mental de Paulo, André Luiz e seu Mentor
perceberam várias mulheres entre elas Ismália, doente,
enfraquecida e ansiosa. Passaram também vários homens,
entre eles Alfredo, desesperado e envelhecido.
Vozes misteriosas se faziam ouvir com maldições sobre
Paulo, como perseguidores ferozes. Por quê?
Paulo foi um falso amigo que arruinou o lar de Ismália e Alfredo.
Envenenou com calúnias outros lares, destruindo a paz das famílias
e traiu outros amigos. No mundo espiritual ele não consegue fugir
da justiça e sua consciência o atormenta, fazendo-o reviver
o mal que praticara e sendo acusado por suas vítimas.
Esse é o verdadeiro inferno em que se debatem os culpados. Os
tormentos morais não precisam de demônios ou de chamas.
É a própria consciência culpada que transforma a
situação do espírito num inferno.
O sofrimento de Paulo será eterno? Não. Deus é
misericordioso e permite que suas criaturas reencarnem para resgatar
suas dívidas. Quando estiver preparado, Paulo vai reencarnar
como filho de uma das mulheres cuja honra caluniou e que aceitou recebê-lo
como filho.
O espírito São Luís em O Evangelho Segundo
o Espiritismo, capítulo 10, item 19, ensina que ninguém
tem o direito de repreender o próximo “[...] a não
ser com o objetivo útil e devemos fazê-lo com moderação.
Nesse caso, é um dever que a caridade nos manda fazer com todos
os cuidados possíveis”.
Assim sendo, podemos repreender a atitude equivocada dos filhos, porque
é para o bem deles, mas sempre com amor e carinho e, sobretudo,
pelo exemplo.
Diante das consequências funestas que a maledicência acarreta
no plano espiritual, quando formos comentar alguma atitude que nos pareça
errada, vamos passá-la pelas três peneiras que o Espiritismo
ensina, de acordo com o que disse o filósofo Sócrates.
Este foi procurado por um amigo, que afirmou ter algo muito grave a
contar-lhe. O filósofo perguntou ao amigo se tinha passado a
notícia pelas três peneiras:
1ª peneira – é a da verdade.
Será que o que eu vou comentar é verdadeiro ou pode ser
mentira? Se não tiver certeza de que é verdade, não
passe adiante.
2ª peneira – se for verdade, examine
também a bondade. Uma coisa pode ser verdadeira, mas não
ser boa. Se não for boa, não comente.
3ª peneira – se o comentário
for verdadeiro e bom, pergunte a si mesmo se é útil. Vai
ser de algum proveito a alguém ou é apenas mexerico?
Se não tiver certeza de que é verdade,
se é bom e se é útil não passe adiante.
Temos que ser o ponto final da fofoca.
No poema “As Armas”, Fagundes Varela (1941/1975) exemplifica
diversos tipos de armas, brancas ou de fogo, das mais simples às
mais sofisticadas, demonstrando a capacidade destrutiva que elas têm.
Com muita propriedade e senso de humor, chega à seguinte conclusão:
“A mais tremenda das armas,
Pior que a durindana, (1)
Atendei, meus bons amigos:
Se apelida a língua humana.”