Espiritualidade e Sociedade





Salomão Jacob Benchaya

>   Da Religião Espírita ao Laicismo: A trajetória do Centro Cultural Espírita de Porto Alegre

Artigos, teses e publicações

Salomão Jacob Benchaya
>    Da Religião Espírita ao Laicismo: A trajetória do Centro Cultural Espírita de Porto Alegre

 

 

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Prefácio


Alguém um dia teria que fazer isso. Bom que seja feito agora, enquanto os personagens dessa história ainda estão por aí, lúcidos e ativos. Aliás, eles continuam se movimentando no mesmo cenário. Irrequietos, insistem, de tempos em tempos, em incursionar por panoramas mais amplos. Não resistem ao impulso de compartilhar experiências e de submeter à apreciação do movimento espírita aquilo que planejam, criam e vivenciam no laboratório de idéias em que se transformou a antiga Sociedade Espírita Luz e Caridade, hoje Centro Cultural Espírita de Porto Alegre. Salomão resolveu contar um pouco dessa história, agora que o CCEPA comemora 70 anos de vida.

Poderá dizer-se que para uma obra de registro histórico, como pretende ser este livro de Salomão Jacob Benchaya, ainda falta a necessária perspectiva só trazida pelo decurso do tempo. Setenta anos é pouco. E se considerarmos que os relatos mais marcantes aqui contidos abrangem um período de pouco mais de três décadas, temos de convir que falta, realmente, aquela angulação histórica capaz de gerar um exame isento dos fatos e uma análise definitiva de seus resultados. Acontece que os fatos, quando não devidamente registrados, se perdem no tempo. Aqui, o narrador é, ao mesmo tempo, personagem. Integra o pequeno grupo de homens e mulheres que, a partir daquele núcleo espírita do bairro Menino Deus, de Porto Alegre, ciclicamente, alçam vôos portadores de sementes de renovação e semeiam idéias por onde lhes permitam pousar. A dupla condição de narrador e personagem não isenta o autor da paixão, mas nunca o faz sectário. Salomão tem um espírito conciliador. Dentro e fora do CCEPA, tem pautado seu trabalho pela
proposta de alteridade no movimento espírita. Alteridade é uma palavra ainda pouco usada em nosso meio. Sua prática é muito menor ainda. De uma certa forma, a idéia se contrapõe àquilo que as religiões, e entre elas também a “religião” espírita, elegeram historicamente como seu material de trabalho: a verdade. Quem supõe deter a verdade e estar predestinado a difundi-la dificilmente há de assumir posturas alteritárias. E, quando ousa fazê-lo, complica-se perante as estruturas a que está vinculado. No núcleo espírita cuja história é aqui registrada, um outro personagem muito citado pelo autor, Maurice Herbert Jones, cunhou uma frase que se tornou lema da instituição: “Sabemos
pouco, não temos certezas definitivas, mas ousamos buscar”.

Talvez nasça justamente daí, da postura humilde que adotou, a importância histórica da pequena casa da Rua Botafogo, na capital gaúcha. Ali só uma coisa é definitiva: a busca. Na obstinada ousadia da busca, o CCEPA tem optado por manter-se pequeno. A maioria das pessoas que aderiram aos postulados básicos espíritas prefere ancorar-se em certezas definitivas. Uma instituição que confessa não detê-la e que, em vez disso, convida e estimula a essa busca não está fadada a atrair multidões. A gente do CCEPA sabe disso e com isso se acostumou. A opção pela qualidade, mesmo em detrimento da quantidade, tem feito com que desavisados tachem o Centro Cultural Espírita de Porto Alegre de elitista ou de um agrupamento de intelectuais. Nada mais falso se considerarmos que toda a história da SELC/CCEPA tem se direcionado a uma proposta de unidade a partir da essencialidade espírita. Quando, ali, foram lançados os primeiros lineamentos do Estudo Sistematizado da Doutrina Espírita, projeto, mais tarde, desenvolvido, aprimorado e oficialmente lançado por todo o movimento espírita brasileiro, a preocupação já era a mesma de hoje: unir através do laço do conhecimento espírita. Isso só se obtém pelo estudo, pela reflexão conjunta, pelo debate franco de idéias e pela dessacralização da proposta espírita. Quando, mais tarde, ali, naquele mesmo núcleo, se começou a aprofundar a tese da identidade espírita, o que, forçosamente, leva ao difícil questionamento religião/não-religião, se estava, igualmente, buscando parâmetros dentro dos quais pudessem conviver distintos segmentos do heterogêneo universo espírita. O respeito às especificidades culturais e geográficas, mantendo- se íntegro e fortalecido o laço inspirado pelos princípios fundamentais da doutrina, estaria, assim, preservado, tal qual recomendou Kardec. Nem sempre esse esforço da SELC/CCEPA e de alguns de seus líderes que se alçaram a postos importantes no movimento espírita foi compreendido. Na sua história mais recente, a integração do CCEPA à Confederação Espírita Pan-Americana – CEPA - e a parceria com outros núcleos internacionais de idênticos propósitos, tem permitido um trabalho conjunto, em círculo, é verdade, ainda bastante restrito, mas sempre aberto ao intercâmbio, ao diálogo e à integração.

Alguém teria que deixar consignada em livro essa história que está em pleno andamento e cujo desfecho, se desfecho houver, ainda não se pode vislumbrar. Ótimo que Salomão tenha se proposto a isso. Misturando paixão e isenção, associando a condição de narrador e personagem, vai legar a gerações futuras o registro de uma história inconclusa que poderá continuar a ser vivida e narrada. Desde que haja ousadia.

 

Milton R. Medran Moreira
Diretor de Comunicação Social do
Centro Cultural Espírita de Porto Alegre – CCEPA.
Presidente da Confederação Espírita Pan-Americana – CEPA

 

Introdução


A história recente do CCEPA - Centro Cultural Espírita de Porto Alegre vincula-se a um movimento de resgate do pensamento de Allan Kardec e de reação ao igrejismo que se institucionalizou no movimento espírita brasileiro. Desde 1968, quando o casal Maurice e Elba Jones aportou à então Sociedade Espírita Luz e Caridade (SELC), a Casa assumiu características marcadamente voltadas para o conhecimento e para a filosofia espíritas, numa profunda identificação com o pensamento kardequiano.


(...)

Preciso dizer, desde logo, que o fato de sermos diferentes não significa que sejamos melhores ou piores. Apenas diferentes. Essas diferenças não deveriam se constituir em motivo para discriminação ou exclusão. Antes, estímulo ao diálogo construtivo e ao aprendizado fraterno entre as diversas vertentes do Espiritismo. As críticas que forçosamente repontarão em minhas observações cingem-se às idéias e comportamentos pessoais ou institucionais resultantes de divergências interpretativas acerca da natureza e da prática do Espiritismo e que não atingem o respeito e a admiração que tenho – como também tem o CCEPA - para com os companheiros e instituições que compõem o nosso movimento.

 

 

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Fonte: http://larbomrepouso.com.br/wp-content/uploads/2020/04/SALOMAO-J-BENCHAYA-DA-RELIGIAO-ESPIRITA-AO-LAICISMO.pdf

 

 



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