Adilson José de Assis
> A Pedagogia espírita em ação através
do diálogo
Há muito
esta seção* tem chamado a atenção
para a reflexão acerca da educação espírita.
Ninguém, com um conhecimento mínimo de Doutrina Espírita,
desconhece o caráter renovador e as propostas arrojadas em
prol da melhoria do espírito humano objetos do estudo e prática
do Consolador. Entretanto, se o caráter (re)educativo da Doutrina
é claro, o mesmo não acontece quando as idéias
devem ir para a prática. É justamente neste ponto que
entra a Pedagogia (ou a Andragogia)
Espírita, como sendo a implementação
do caráter educativo da Doutrina nas práticas diárias
da Casa Espírita. Em tese, todas as atividades espíritas
deveriam ser fundadas em ideais educativos e conduzidas por uma pedagogia
libertadora, consoladora e acolhedora. Entretanto, não é
incomum o esquecimento de tais fundamentos. Quando isto acontece,
as atividades são realizadas sem um objetivo claro, caindo,
via de regra, na mesmice e na rotina desmotivadora, quando não
se transformam em anti-doutrinárias.
Dentre as atividades desenvolvidas na Casa Espírita o diálogo
fraterno é uma das mais “delicadas”, pois
demanda um conjunto de características por parte do dialogador,
tais como, conhecimento da doutrina e de fundamentos de psicologia
humana, bom-senso, compaixão e esforço na auto-superação,
nem sempre presentes nos candidatos à condução
ou execução do trabalho. Entretanto, o diálogo
acolhedor é uma importante tarefa, por permitir o esclarecimento,
o consolo imediato, a reflexão, enfim, o diálogo
em si. Mas, o que é dialogar?
Segundo o dicionário [1], a palavra
diálogo significa: (i) fala entre duas ou
mais pessoas; conversação, colóquio. (ii) Troca
ou discussão de idéias, de opiniões, de conceitos,
com vista à solução de problemas, ao entendimento
e à harmonia; comunicação. Como forma literária,
Platão é considerado o criador insuperado deste gênero,
como são suas obras A República, Fédon,
Apologia de Sócrates, etc., nas quais Platão
retrata os debates entre Sócrates e vários interlocutores
acerca de problemas tais como a educação, a imortalidade
da alma, a justiça, o bem, a beleza, para citar alguns exemplos.
Allan Kardec utilizou a mesma forma literária
na compilação de O Livro dos Espíritos,
no qual exerce a função de quem formula as perguntas,
mas também de quem debate, explora as conseqüências
das respostas dadas pelos espíritos da equipe de O Espírito
da Verdade, faz comentários e sintetiza os assuntos mais complexos.
Etimologicamente a palavra diálogo vem do
Grego [2], sendo composta a partir de
día + logos. A palavra día
dá a ideia de passagem, de trânsito, como quando usamos
em diagonal, diáspora, diagnóstico,
etc. Já logos sintetiza vários significados
que, em português, estão separados, tais como: narrar,
falar, discutir, pensar, refletir, raciocinar. Foi traduzido freqüentemente
como sendo razão, inteligência,
linguagem. Entrou na composição de
palavras tais como psicologia, meteorologia,
lógica, significando conhecimento de, estudo
de. Portanto, diálogo quer dizer “o
fluir do logos”, da fala, da reflexão, da razão
(=raciocínio lógico).
Assim sendo, para haver diálogo, há que haver fluir
de ideias, num sentido e no outro, nunca uma simples doutrinação
na qual o dialogador está preocupado apenas em “incutir”
um conjunto de crenças na pessoa que procura a Casa Espírita.
As dúvidas, as incertezas, as angústias de quem procura
o diálogo devem ser ouvidas, respeitadas, acolhidas e respondidas
de modo respeitoso, sem imposições, sem salvacionismo
e sem demagogia. O diálogo é entre encarnados, de alma
para alma e de coração para coração, sob
a inspiração dos bons espíritos e não
uma consulta espiritual. Cada atividade tem seu valor, sua metodologia
e seu tempo próprio. No diálogo fraterno é o
momento dos encarnados! Deixa-se para a reunião mediúnica
o diálogo com os desencarnados, pois para este deve-se antes
fazer um curso de preparação, conhecer antes quem habita
o além-túmulo e as leis que regem a comunicação
entre os dois planos da vida, como nos ensina o mestre Allan Kardec
em O Livro dos Médiuns. Ninguém deve adentrar um laboratório
de química, sem conhecimento desta matéria, e começar
a fazer experimentos, sob risco de vida.
Deve ainda o diálogo se primar pelo “bom senso”,
freqüentemente ausente nesta atividade, principalmente quando
o dialogador está mais preocupado em desempenhar um papel de
“sabe-tudo”, de “médium revelador”
que conhece passado, presente e futuro, quando na verdade a discrição
absoluta e a verdade é que deveriam inspirar sempre a atividade.
Além disto, no diálogo fraterno não é
o momento para doutrinar espíritos nem de realizar uma mini-sessão
mediúnica. Ali, naquele instante, deve-se tratar a mente, a
razão ou a emoção daquele que busca o diálogo
e que carrega consigo dramas, temores, dores, carências, e que
provavelmente estão na origem das más influências,
ou obsessões, quando presentes. Faz-se necessário que
haja a compreensão por parte de quem procura o diálogo
de rudimentos da lei de justiça, de bondade, de ação
e reação, da reencanação, da influência
dos espíritos, enfim, fundamentos da Doutrina Espírita.
É o momento do diagnóstico, do medicamento ligeiro,
do acompanhamento, do consolo e da esperança e nunca de ameaças,
de julgamentos e de personalismo. O tratamento deve vir depois, na
forma de passes, de água fluidificada, da oração,
do trabalho no bem, da instrução e da desobsessão,
conforme cada caso.
Prática espírita pressupõe respeito aos postulados
espíritas. Fora disto, é trair a Doutrina e esquecer
que a finalidade desta é a construção do homem
de bem, único capaz de reformar as instituições
humanas, através da educação [3]. Na casa espírita
em particular, a pedagogia espírita deve estar a serviço
da renovação dos caracteres, sendo o diálogo
uma importante atividade para acolher quantos procuram no Movimento
Espírita lenitivo, consolo e esclarecimento para os vários
males que caracterizam nossa época.
Referências Bibliográficas:
[1] FERREIRA, A. B. H. Dicionário Aurélio
Básico da Língua Portuguesa. Ed. Nova Fronteira, RJ, 1988.
[2] CHAUÍ, M. Introdução à
História da Filosofia. Vol. 1 – Dos pré-sócraticos
a aristóteles. 2ª ed., Companhia das Letras, SP, 2002.
[3] KARDEC, ALLAN. O Livro dos Espíritos. 67a.
ed. FEB, Q. 914, 1987.
Fonte: * Texto originalmente publicado
no jornal Vida Espírita da AME de Uberlândia.
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https://veredasespiritas.wordpress.com/2011/05/04/a-pedagogia-espirita-em-acao-atraves-do-%e2%80%9cdialogo%e2%80%9d/
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