06/09/2014
por Luiz Felipe Pondé
colunista do jornal Folha de São Paulo
Neopentecostais veem eleição do povo
judeu como a base da felicidade, e não como um peso
Por que os neopentecostais são apaixonados pelo
que os cristãos chamam de "Velho Testamento"?
O termo, recusado pelos judeus, que usam "Tanach" para o cânone
hebraico, ou "Bíblia Hebraica", no rastro do crítico
literário judeu americano Harold Bloom, reúne o conjunto
de textos que vem antes do Novo Testamento. Neste, Jesus, o Messias
dos cristãos, anuncia a "nova aliança" do Deus
de Israel com a humanidade, diferente da "antiga aliança",
que seria apenas com o povo eleito, os hebreus. Salomão foi um
dos mais importantes reis hebreus.
A diferença de terminologia para se referir a este conjunto de
textos não é mero detalhe de um obcecado por estudos bíblicos,
mas encerra em si um equívoco, do ponto de vista judaico, do
que significa a chamada "eleição do povo de Israel".
De certa forma, grande parte do cristianismo compreende a eleição
de Israel de um modo equivocado. A eleição é uma
responsabilidade, um peso, não a escolha de um caçulinha
mimado fadado ao sucesso. Aqui nasce o equívoco e, ao mesmo tempo,
a paixão neopentecostal pelo Velho Testamento.
O "Templo de Salomão" construído pela Igreja
Universal do Reino de Deus, é uma peça de fé, não
uma reconstrução arqueológica, nem precisa ser,
uma vez que estamos falando de religião, instituição
que nada tem a ver com as demandas de uma ciência como a arqueologia.
O templo original, supostamente construído pelo rei Salomão,
filho do rei Davi, no século 9º antes de Cristo, teria sido
destruído por volta 586 a.C. Pesquisas arqueológicas situam
os fragmentos encontrados no Monte do Templo, que poderiam ser da primeira
sede do culto hebraico antigo, há cerca de 3.000 anos atrás,
o que coincide com a vida do personagem bíblico em questão.
Mas, de onde vem essa paixão? Vem do fato que os neopentecostais
(que se diferenciam dos seus "antepassados" pentecostais pelo
forte caráter de "espetáculo para as massas"
nos cultos) leem a relação entre o Deus de Israel e seu
povo eleito numa chave mágica. Os fatos narrados no "Tanach"
(Velho Testamento) indicam uma forte presença de Deus nos destinos
do povo, alterando círculos naturais, criando forças a
favor do povo, enfim, fundando um mundo de "milagres".
Daí que, revivendo o Templo de Salomão, supostamente,
a Igreja Universal dá um importante passo simbólico no
sentido de dizer que seus fiéis revivem a relação
de povo eleito com seu Deus, Rei do Universo ("Melech HaOlam").
A imagem é forte, temos que reconhecer. Mas, aqui reside a chave
da interpretação equivocada que leva a paixão dos
neopentecostais por todos os signos vétero-testamentários.
O equívoco está no fato que o mundo mágico do Velho
Testamento é apenas uma pequena parte da eleição
de Israel. Mas os neopentecostais parecem crer que essa "mágica
israelita" é a base para o sucesso, a felicidade, e, finalmente,
para a teologia da prosperidade que marca o movimento neopentecostal.
Dito de forma direta: quem vive com o Deus de Israel fica rico e feliz.
Ledo engano, basta ver a história dos judeus e os jornais atuais.
A eleição do povo de Israel, para os judeus, significa
muito mais que o povo é um povo de sacerdotes, que leva a mão
de Deus sobre si, num mundo de agonias, que recusará e odiará
esse povo justamente por isso. Não é por outra razão
que se chama o massacre de judeus na Segunda Guerra de "Holocausto".
O povo é "um animal do sacrifício", e cada vez
que Deus quiser, Ele o lança ao fogo para "falar" com
o mundo.
A eleição de Israel é muito mais um peso do que
um ticket para o sucesso. Tem mais a ver com o conflito israelo-palestino,
através do qual muitos odeiam Israel, do que com ficar rico e
feliz. Se perguntarmos a muitos judeus religiosos em Israel e no mundo,
dirão que o desespero que passa Israel hoje, o medo do ódio
do mundo e da destruição do Estado de Israel, é
mais uma marca da sofrida eleição.
Por isso, não é difícil encontrar judeus que pediriam
a Deus, assim como profetas o fizeram, que escolha outro povo para ser
Seu eleito, porque Israel já cansou.
Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/178587-universal-usa-o-velho-testamento-para-reviver-relacao-do-povo-eleito-com-deus.shtml
>>> clique aqui para acessar a página principal
de Notícias
>>>
clique aqui para voltar a página inicial do site
>>>
clique para ir direto para a primeira página de Artigos, Teses e Publicações