25/01/2014
Filme busca raízes do mal ao
analisar a psique dos pelotões nazistas
Diretor Stefan Ruzowitzky tenta descobrir como jovens
normais se tornam máquinas de matar, tomando como exemplo membros
de tropas alemãs responsáveis por milhões de assassinatos
de civis durante Segunda Guerra.

O cineasta austríaco Stefan Ruzowitzky (vencedor do Oscar
de melhor filme estrangeiro em 2008 com Os falsários)
ousa se equilibrar numa tênue linha entre a explicação
e a acusação, tentando tirar lições para
nossa sociedade atual.
Das radikal Böse ("O mal radical", em tradução
livre) é uma espécie de ensaio cinematográfico
documental, que se propõe desvendar como homens psiquicamente
saudáveis podem se tornar verdadeiras máquinas de matar.
Neste caso, os objetos da pesquisa são os membros dos chamados
Einsatzgruppen ("forças-tarefa") grupos paramilitares
comandados pelas SS, que durante a Segunda Guerra assassinaram cerca
2 milhões de pessoas, na maioria judeus, nos territórios
do Leste Europeu ocupados pela Alemanha.
O filme mostra entrevistas com historiadores e psicólogos, busca
respostas em diários, trechos de cartas, registros de tribunal.
Cenas históricas não são propriamente encenadas:
a maior parte do tempo o espectador vê rostos de atores desconhecidos,
em plano próximo, com as vozes sempre em off.
Experimentos reveladores
Ruzowitzky encena experimentos famosos, como o de aprisionamento de
Stanford ou o de Milgram, em que os pesquisadores comportamentais testaram
a disposição dos voluntários de torturar outras
pessoas, supostamente obedecendo a uma ordem superior. A maioria dos
participantes aceitou torturar o próximo, e o fato de as cenas
serem apresentadas de forma estilizada e distanciada não contribui
para amortecer o devastador efeito sobre o espectador.
O longa-metragem apresenta com explicitude incômoda aquilo que
geralmente nos recusamos a admitir: os membros dos Einsatzgruppen tinham,
sim, uma alternativa. Eles podiam perfeitamente ter recusado as ordens
superiores para matar, sem correr risco de vida. Só arriscariam
ser transferidos ou a ficar de fora na próxima rodada de promoções
hierárquicas.
"A única restrição era quanto ao motivo",
observa o historiador Andrei Angrick, que há anos pesquisa
os Einsatzgruppen.
"Era possível ao soldado argumentar que não fora
para a frente de batalha para matar mulheres e crianças, mas
sim para lutar. Entretanto, um argumento de fundo ideológico
poderia se tornar um problema para ele."
Quem se recusava a participar de esquadrões da morte era transferido
para realizar outras tarefas. Angrick confirma que o soldado não
precisava temer ser excluído nem punido.
Para os soldados no filme, a primeira participação num
pelotão de fuzilamento representa grande sofrimento emocional.
Em seguida, porém, processos de dinâmica de grupo e pressão
social à conformidade passam a agir, aliviando a carga psicológica.
A doutrinação propagandística faz o resto: no fim,
o assassinato em massa passa a ser apenas um trabalho sujo que precisa
ser feito, para que um objetivo maior seja alcançado.
"No Estado nazista, a utopia germânica era uma promessa
de felicidade, de uma sociedade perfeita", explica Andrej Angrick.
"Os judeus não foram mortos porque eram judeus, mas porque
eles e as outras vítimas da perseguição nazista
eram estorvos para se atingir um 'Jardim do Éden Ariano', segundo
os nazistas.
A guerra de extermínio foi uma guerra de utopia, em cujo final
estava a promessa de salvação para todos os que participavam
dela."
Cena de "Das radikal Böse"
Risco de "compreender demais"
O título do filme de Stefan Ruzowitzky provém de um texto
do alemão Immanuel Kant, do final do século 18. De forma
simplificada: nele o filósofo argumenta que a predisposição
para violar normas e padrões morais repousa em cada um de nós.
O famoso psiquiatra nova-iorquino Robert Jay Lifton fala no filme do
"potencial humano" para fazer o mal que está em todos.
Mas e quando esse mal irrompe, quando ultrapassa as fronteiras do moralmente
aceitável? Lifton vê a solução na cultura
política, que forneceria ao indivíduo limites para a sua
ação.
O historiador alemão Andrej Angrick discorda: para ele, a influência
maior é do contexto social.
"Acredito que, numa outra sociedade, 95% dos membros dos Einsatzgruppen
não se tornariam criminosos extremos.
Cultura política por si só não ajuda. São
necessárias elites com boa formação."
Ele também considera fundamental o papel da Justiça.
"O Estado deve não só ameaçar com punições,
mas também fazer valer limites."
Além disso, uma sociedade não deve cometer o erro de
desenvolver o que ele chama de "cultura do diálogo compreensivo
demais". Um exemplo disso seria a forma como se lida com os neonazistas
na Alemanha.
"A compreensão das circunstâncias sempre traz
em si o risco da exoneração de culpa, do perdão
e, com isso, também da aprovação."
O filme de Ruzowitzky não cai na armadilha de perdoar e aprovar.
No final, fica claro que os assassinos não podem alegar falta
de alternativa, nem delegar a culpa a um Estado nazista abstrato. Eles
são, sim, pessoalmente responsáveis pelos seus atos.

Cartaz do filme que estreou em janeiro na Alemanha
Fonte:
http://www.dw.de/filme-busca-ra%C3%ADzes-do-mal-ao-analisar-a-psique-dos-pelot%C3%B5es-nazistas/a-17370732?maca=bra-newsletter_br_dw-cult-6223-html-newsletter
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