21/03/2007
Susana Sarmiento
Portal Setor 3 Senac SP
"O desenvolvimento não se espera,
ele se faz", opina o economista Ladislau Dowbor,
professor titular da pós-graduação em Economia
e Administração da Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo, que destaca as ações comunitárias
em prol do desenvolvimento local em diversas comunidades. "Em muitos
lugares do Brasil, as pessoas cansaram de esperar e isso implica um
novo tipo de atitude", reforça.
De acordo com o professor, hoje há 93 milhões
de pessoas que fazem parte da população economicamente
ativa, sendo que apenas 27 milhões estão no setor privado
e 7 milhões no setor público. No estudo "Brasil:
o Estado de uma Nação", de 2006, elaborado pelo Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), o capítulo O Desempenho
Recente do Mercado de Trabalho aponta que em 2004 52% trabalhavam de
maneira informal. Portanto, grande parte da população
tem que se virar como pode para conseguir pagar suas contas no final
do mês.
Ladislau aponta que as metrópoles têm
mais dificuldades em se desenvolverem, porque hoje convivem com excedente
populacional. Ele citou, por exemplo, a Cidade Tiradentes,
bairro da zona leste de São Paulo, que tem hoje 190 mil habitantes
em idade ativa, sendo que 2.400 estão desempregados.
"As periferias de São Paulo crescem de
5 a 7% ao ano", alerta.
Para mudar o estereótipo de comunidade violenta,
cerca de 13 instituições da comunidade Cidade
de Deus, no Rio de Janeiro, uniram-se para criar o Comitê
Comunitário Cidade de Deus. A favela ficou conhecida no longa-metragem
de Fernando Meirelles, lançado em 2002. O bairro é formado
por cinco grandes favelas e outras 57 pequenas comunidades, como Ilha
das Drogas, Macedo Sobrinho, Parque do Proletário da Gávea,
dentre outros. Quando governador do estado, Carlos Lacerda elaborou
um projeto de transferência das pessoas pobres do centro para
a periferia. Começou a se formar aí, o complexo de favelas.
Buscando mudar a situação de exclusão
dos moradores de Cidade de Deus, as organizações decidiram
estabelecer diretrizes em prol de seu desenvolvimento. Para isso, criaram
a Agência Cidade de Deus de Desenvolvimento Local. As associações
realizaram pesquisas para conhecer as principais demandas da população
local. Com os resultados, dividiram em nove comissões para aplicarem
ações nas áreas defasadas, como educação,
trabalho e renda, cultura, comunicação, dentre outros.
"Ao contrário que
o filme mostra, aqui não só tem bandido. Tem muita gente
que é trabalhadora", esclarece Kátia Nicacio da
Silva, integrante do corpo administrativo da Agência Cidade
de Deus de Desenvolvimento Local. Moradora da comunidade há
36 anos, Kátia trabalha em projetos sociais há cinco
anos e defende que o desenvolvimento local é tudo aquilo em
que a comunidade se sente envolvida e valorizada. Atualmente a Agência
oferece cursos de Economia Solidária para os integrantes das
organizações do Comitê, formação
de educadores, alfabetização de adultos e cursos pré-vestibulares.
O professor Ladislau defende que para termos nos centros
urbanos um desenvolvimento local é fundamental ter a integração
das políticas. "Na realidade, cada município tem
que adotar um conselho ou uma agência de desenvolvimento local.
É preciso articular empresários, ongs, prefeituras, para
que tenha uma política coerente e integrada", avisa.
Desenvolvimento local pode se tornar uma política
federal
Com objetivo de ajudar projetos focados em desenvolvimento
local, um grupo de especialistas, políticos e articulistas da
área social elaborou um texto, que é um resumo de um ano
e meio de pesquisas e discussões sobre o setor informal da economia,
conhecida como as iniciativas comunitárias. Foram elaboradas
89 propostas com medidas práticas de acesso ao financiamento,
a redes de apoio tecnológico, a mudança institucional,
entre outras na área da informação, comunicação,
capacitação, emprego e meio ambiente. Trata-se de uma
proposta de mobilização feita pelos protagonistas sociais.
Através de um questionário, foi possível
identificar medidas para remover os entraves para o crescimento das
experiências de desenvolvimento local. O projeto foi organizado
pelo Instituto Cidadania junto com entidades referenciais nesta temática.
Desde o início de 2005 começaram os debates e a síntese
desse documento, que apresenta propostas políticas de apoio ao
desenvolvimento local.
No dia quatro de dezembro, o projeto foi entregue ao
presidente da República Luís Inácio Lula da Silva
numa reunião com os ministros. Segundo Ladislau, foi acordada
com o ministro Tarso Genro a criação de uma câmara
técnica para ter esse projeto na estrutura federal e tecer relações
com os diversos ministérios.
"Não basta distribuir, tem que dar para
toda parte pobre do país instrumentos técnicos, apoio
financeiro e formação. Deve ser mais amplo o processo
de inclusão produtiva", defende.
O professor citou que uma das propostas do projeto
é que as escolas apresentem a própria cidade para as crianças.
Por exemplo, as escolas municipais de Pintadas, no interior da Bahia,
incluíram em seu currículo escolar o estudo do semi-árido.
É uma forma dos alunos conhecerem a realidade local e escolherem
profissões de acordo com o lugar onde vivem.
Caio Silveira, coordenador da Rede de Desenvolvimento
Local e Sustentável (DLIS) e da Expo Brasil Desenvolvimento Local,
explicou que o desenvolvimento local não tem uma escala pré-definida
e as áreas urbanas passam por um maior desafio por terem muitas
áreas marginalizadas.
"Essas comunidades de baixa renda estão
avançando na construção de novos espaços
para integrar toda a população local. Para conseguirem
sustentabilidade, é importante o protagonismo, porque analisa
as demandas reais e cria uma base local", afirma.
O capital social também é considerado
pelos especialistas um fato básico para o desenvolvimento social.
"É importante todas as comunidades não
terem uma política centralizadora, mas disponibilizarem as
suas potencialidades, discutirem propostas e ultrapassarem obstáculos,
como políticas de financiamento, legislação e
comunicação, por exemplo", analisa.
Ladislau argumenta que com uma sociedade organizada
é viável o desenvolvimento de projetos e até melhorar
a qualidade de vida local. Citou ainda o exemplo da Pastoral
da Criança, ONG criada para combater as altas taxas
de mortalidade infantil no Brasil, que é administrada por 62
pessoas e conta com 250 mil voluntários em 3500 municípios.
"É uma espécie de GM [montadora de automóveis].
Funciona como uma instituição horizontal, em rede e com
grande densidade de informação e autonomia de decisão",
pontua.
A Pastoral da Criança começou em 1983
com um projeto-piloto em Florestópolis, Arquidiocese de Londrina,
localizada no norte do Paraná. A maioria (74%) da população
da cidade trabalhava como bóias-frias e morriam 127 crianças
para cada mil nascidas vivas. Depois da ação dos líderes
comunitários da Pastoral, esse índice caiu para 28 mortes
para cada mil nascidas vivas.
"Isso não aparece
no PIB (Produto Interno Bruto). Ao contrário, o que aparece
é o número de hospitais construídos e gastos
com medicamentos. Na verdade, são comunidades que se
apropriaram de suas problemáticas. Nós temos
que fazer as contas de maneira diferente. Só temos o cálculo
do PIB. Não temos ainda uma sistematização da
qualidade de vida em cada cidade. Como nos países desenvolvidos,
precisamos elaborar um balanço anual da qualidade vida nas
cidades para tomarmos consciência gradualmente e criarmos uma
cultura diferente. Não é esperar um cara milagroso pra
resolver os problemas. Todas as coisas que funcionam é quando
a sociedade está organizada em torno de seus interesses",
conclui o professor.
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