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>    Empreendedorismo gera renda e toma lugar de filantropia

 

 


10/03/2007

 

Ações de estímulo à geração de renda visam fim da relação paternalista entre companhias e comunidades carentes

Pequenos negócios, como cooperativas de reciclagem, criam oportunidades de sustento para excluídos do mercado de trabalho formal

 

JULIANA GARÇON
FOLHA de SP

 

A proposta de "ensinar a pescar, em vez de dar o peixe" está se consolidando nas carteiras de investimento privado de companhias brasileiras devido ao amadurecimento da ação social no país. A opinião é dos professores Nísia Werneck, de prática empresarial e responsabilidade social do núcleo de gestão responsável para sustentabilidade da Fundação Dom Cabral, e Afonso Cozzi, coordenador do núcleo de empreendedorismo da instituição.

"As empresas estão fugindo de ações filantrópicas, estão em busca de ações mais estruturantes, que geram autonomia, não dependência", diz Werneck.

Nessas ações, os indivíduos recebem orientações sobre gestão, contabilidade, tributação, informática e relação com o público, entre outras habilidades necessárias para que criem uma fonte de renda.

"Após a fase da visão paternalista, hoje as empresas pensam em programas de desenvolvimento de comunidades e das pequenas empresas que formam sua cadeia de produção", diz Cozzi.

Para ele, corporações que atuam para desenvolver seus fornecedores e distribuidores agregam ao negócio um diferencial competitivo.

Como tendem a demandar processos de longo prazo, as ações que visam criar possibilidades de geração de renda são geralmente abraçadas por companhias de grande porte.

"Empresas de mineração, que ficam um longo tempo numa região e depois se retiram, procuram deixar um legado de desenvolvimento no local, já que provocam grande impacto com sua instalação", diz Werneck.

Também se identificam com essa modalidade, lembra ela, negócios que pretendem se manter por um longo período em determinada região, mas que, em decorrência de ganhos de eficiência, reduziram a absorção de mão-de-obra.

Os projetos de geração de renda, dizem os especialistas da FDC, tradicionalmente atingem populações campesinas e do interior do país, atendendo grupos de "ofícios tradicionais", como costureiras, pescadores, agricultores e artesãos. É o caso do Jovem Produtor, que a Pfizer iniciou neste ano no semi-árido do Piauí para multiplicar conhecimentos sobre a criação de pequenos animais.

Mas duas novas vertentes começam a se estabelecer: a de ações voltadas a jovens - de zonas urbanas e rurais, como no caso da Pfizer - e a de negócios relacionados ao ambiente, muitas vezes relacionados à atividade de reciclagem. Assim, essas iniciativas também estão aparecendo nas cidades.

O programa Miniempresa do Centro de Estudos Instituto Unibanco, realizado em parceria com a Associação Junior Achievement, junta as duas tendências ao complementar a educação de quatro mil estudantes de nove capitais, incluindo São Paulo, Rio e Porto Alegre. Os adolescentes recebem reforço escolar numa programação que pretende desenvolver a capacidade empreendedora e a visão realista de empresas e negócios. Já a Pro-Social, entidade criada há um ano no Rio pela educadora Andrea Ramal e a consultora e professora de administração de empresas da PUC-Rio Silvina Ramal, está realizando um trabalho de formação de empreendedores com um grupo de 20 jovens carentes de Santa Tereza. O programa terá dois anos.

A Fundação Banco do Brasil, por sua vez, apóia de 300 a 400 iniciativas relacionadas à agricultura familiar, a maioria no semi-árido. Mas desde 2003 vem investindo na inserção dos catadores em toda a cadeia produtiva de recicláveis no Estado.

Até agora, R$ 2,2 milhões foram aplicados e 16 municípios paulistas já têm ao menos uma cooperativa estruturada. Uma delas é a Cooperativa Granja Julieta, na zona sul da capital, criada em outubro de 2003 pela junção de vários grupos de catadores. Além de capital, a fundação levou capacitação ao grupo. A prefeitura paulistana cedeu caminhões, prensa e equipamentos de proteção e espaço.

Foi nessa época que Márcia Abadia Martins, 41, auxiliar administrativa desempregada e sem perspectivas de voltar ao mercado, passou pela capacitação e aderiu à cooperativa em busca "de uma saída". Hoje ela é presidente da entidade, mas ainda participa de todos os processos: separação, triagem e beneficiamento. "Aqui tem de rezar o alfabeto inteiro", diz.

Desde 2005, a Granja Julieta e outras oito cooperativas - na capital, em São Carlos, em Diadema e em Piracicaba - formaram a Central de Cooperativas de Materiais Recicláveis, que congrega 300 catadores e, com volumes maiores para negociar com as indústrias, obtém condições mais vantajosas.

O Wal-Mart também está apoiando, desde o fim de 2005, além de costureiras e artesãos, cooperativas de catadores.

"Todo catador é um empreendedor em potencial", avalia Jacques Pena, presidente da Fundação Banco do Brasil.

 

Desperdício

Apesar do mérito das propostas que vêm surgindo no país, diz Pena, há grande desperdício de dinheiro, tempo e esforços nos projetos de geração de renda.

"É preciso ter uma estrutura profissionalizada para desenvolver esse tipo de investimento social", afirma Pena.

"Em vez de criar uma programa, os investidores que não têm experiência deveriam aderir às soluções já testadas, como o programa "Um Milhão de Cisternas Rurais", coordenado pela Articulação no Semi-Árido Brasileiro."

Para Werneck, o maior risco para as iniciativas é se tornarem um projeto "da empresa".

"A companhia pode contribuir com sua visão de mercado. Mas o projeto tem de ser participativo, pois a médio prazo a empresa pode sair e o negócio deve continuar. O projeto tem de ser dos beneficiados, não da empresa."

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