"Mas, estamos certos dos fatos
observados? Homens de Ciência são muito rápidos
em pontificar que devemos estar certos dos fatos antes de
se embarcar em uma teoria. Felizmente, os que dizem isso
não o fazem na prática. Observação
e teoria funcionam de forma ótima quando integradas,
uma ajudando a outra na busca da verdade. É uma boa
recomendação não confiar demais em
uma teoria até que tenha sido confirmada pela observação.
Espero não chocar os físicos experimentais
ao dizer que também é uma boa regra não
confiar demais nos resultados da experiência até
que eles tenham sido confirmados pela teoria."
Sir Arthur Stanley Eddington (1882-1944)
Astrônomo e físico inglês.

Embora seja possível ter
uma postura dogmática sem apelar para a Ciência,
isso raramente acontece na atualidade, visto que a ciência
moderna, dado seu alto grau de especialização e
sucesso em desenvolvimentos tecnológicos e nas descobertas
da Natureza, é invocada pelo pseudoceticismo para invalidar
ou sustentar certas proposições a respeito do mundo.
Não há espaço
aqui para um estudo profundo sobre os fundamentos da Ciência,
o que é feito por um campo da filosofia conhecido como
Epistemologia da Ciência. Importa muito mais saber sobre
onde repousa a autoridade da ciência, visto que o que é
invocado pelo pseudoceticismo é a sua autoridade, muito
mais do que seu conteúdo de conhecimento.
Isso é importante, visto
que o conhecimento pode ser fundamentado de diversas maneiras,
ou seja, podemos sustentar determinada posição a
respeito do mundo tanto usando um apelo à autoridade (como
fizeram autoridades da Igreja no caso de Galileu Galilei, ao invocarem
as Escrituras Sagradas, para invalidarem a tese do movimento da
Terra) ou fundamentar a autoridade no próprio conhecimento.
Em suma:
* Conhecimento baseado
na autoridade: certas proposições sobre
as ocorrências do mundo são de uma determinada
maneira porque alguém disse que é assim. Exemplos:
recorrer à Bíblia para proibir práticas
ou posturas, ou dizer, de certa forma, que 'a Ciência
não comprova isso ou aquilo' como querendo implicar que
'os cientistas não acreditam nisso'. Nesse último
caso, Ciência é confundida com a 'opinião
dos cientistas', que, tanto quanto diz a lógica não
tem autoridade fora do campo de estudo a que se dedicam;
* Conhecimento baseado
no próprio conhecimento: aqui a fundamentação
é algo mais sutil e pouco conhecida. A autoridade da
Ciência tem como escopo os objetos de estudo de uma determinada
ciência em particular. Dentro desse escopo (e isso é
muito importante) a autoridade das doutrinas científicas
está baseada nas próprias teorias, ou seja, na
capacidade demonstrada dessas teorias em prever acontecimentos
e explicar fatos. Exemplo: é certo que a Terra gira em
torno do Sol em órbitas elípticas porque o movimento
dos astros em seus mínimos detalhes, como vistos desde
a Terra pode ser explicado dessa forma. Ao se tentar explicar
de outra maneira, as explicações falham em determinados
aspectos (mas não em todos!). Por lógica, a explicação
mais abrangente e capaz de prever ocorrências não
observadas (predições da teoria) é a de
maior autoridade.
Muita gente invoca a autoridade da ciência como que fundamentada
na opinião dos cientistas. Um exame detalhado de como a
Ciência se estabeleceu ao longo de sua história mostra
que essa opinião é deficiente. Acreditamos na Ciência
porque ela é capaz de nos trazer uma descrição
satisfatória a respeito de certos fenômenos que estuda
(e não, como pretendem alguns, 'uma visão do mundo').
Acreditar que a Ciência
nos traz uma visão de mundo que se pode generalizar para
todos os aspectos, mesmo aqueles que ela não estuda e que,
por extrapolação, são explicados dentro de
determinadas creças, é uma postura chamada 'cientificismo'.
Cientificistas acreditam não
só que a Ciência é o caminho a ser usado para
estudar qualquer coisa, mas que a Ciência atual já
consegue explicar qualquer coisa (teoria de tudo). De fato, podemos
dizer que é razoável esperar que a Ciência
seja o caminho a ser seguido para se estudar os mais variados
fenômenos (mesmo aqueles que não fazem parte do grupo
de fenômenos estudados pela comunidade científica
presentemente, mas novos fenômenos em estudos de fronteira).
Entretanto, será que o conhecimento científico atual
pode ser usado para explicar tudo?
É certo que os desenvolvimentos
da Ciência revelaram aspectos da estrutura do mundo que
merecem a atenção de todos que pretendem estudar
novos fenômenos, inclusive anomalias:
* Há uma lógica
inerente nas leis da Natureza. O universo conhecido
(ou seja, aquele que é objeto de estudo sistemático)
pode ser descrito por meio de leis que determinam como os fenômenos
ocorrem sob determinads condições ou contextos;
* Acaso e aleatoriedade
desempenham um papel importante, embora existam questões
profundas relacionadas aos fundamentos do acaso - sobre se ele
é 'irredutível' ou não - ou seja, sobre
se essa aleatoriedade não se deva antes a ignorância
de fatores e não a um caráter inerentemente estocástico
das leis da Natureza;
* 'Não existem
milagres'. Por definição, um milagre
é uma derrogação das leis da Natureza.
Como não podemos dizer que temos o conhecimento completo
a respeito dessas leis, a ideia de se utilizar milagres para
explicar certos fenômenos não pode ser bem vista.
O mais correto é assumir que não conhecemos tudo
e uma ocorrência 'milagrosa' é uma ocorrência
natural de causa e condições de ocorrência
desconhecidas;
* O Universo é
muito grande. Tanto em termos de suas dimensões
físicas e temporais (muito antigo e de futuro desconhecido),
como também em sua distribuição hierárquica
de dimensões. As variadas escalas de ocorrência
dos fenômenos (desde o microcosmo quântico até
a escala cosmológica) atestam uma hierarquização
extraordinária na maneira como as leis físicas
operam. Também a 'grandeza do Universo' implica em nossa
incomensurável ignorância a respeito do funcionamento
mais íntimo de muitos eventos naturais. A postura correta
para se conhecer a verdade é a humildade diante dos fatos
naturais e não a arrogância;
* A pesquisa científica
é o veículo de busca do conhecimento a respeito
das coisas da Natureza. Entretanto, não existe
um 'método' ou 'receita' para se fazer ciência.
Cada fenômeno, assim como cada objeto de estudo tem seu
próprio método ou ferramenta de pesquisa. Querer
forçar as coisas, utilizar procedimentos e regras específicas
para estudar ocorrências desconhecidas é um erro.
Mas erro pior é tirar conclusões a respeito de
certos fenômenos com base numa aplicação
incorreta de um método. Por exemplo: eventos psíquicos
não podem ser reproduzidos em laboratório. Isso
é uma característica do fenômeno que exige
condições especiais de ocorrência. Muitos
céticos dogmáticos concluem pela inexistência
dessas ocorrências psíquicas por causa de sua não
reprodutibilidade. A falta de conhecimento a respeito das condições
é um entrave ao desenvolvimento da Ciência, tanto
no estudo de fenômenos muito conhecidos como com as ocorrências
mais raras.
De todas essas considerações, a falha em compreender
a última colocação acima tem sido um obstáculo
ao desenvolvimento da ciência dos fatos espíritas.
Grande parte da retórica pseudocética gira em torno
da reprodutibilidade dos fenômenos anômalos exigindo
condições descabidas para sua ocorrência.
Isso decorre de uma postura tendenciosa de se repelir sistematicamente
fatos que não se enquadrem em uma visão preconcebida
do mundo que os pseudocéticos dificilmente reconhecem.
Em resumo: a
autoridade da ciência está fundamentada em sua própria
capacidade de explicar os fenômenos que estuda
e não na opinião dos cientistas. Não há
como fundamentar a verdade em 'comitês' ou 'grupos de pesquisa',
'associações' ou 'academias'. Para verificar isso
é só observar os inúmeros exemplos da História
da Ciência, de como a opinião apressada ou sem reflexão
de cientistas famosos prejudicaram o desenlvimento dessa própria
Ciência. A Natureza guarda suas verdades que somente podem
ser reveladas com muito trabalho, esforço, compreensão
e proposição audaciosas de novas teorias.