Túu-Túu-Túuu- Ressoava
novamente lá pras bandas de Ouro Fino, no Estado de Minas
Gerais, o brado daquele berrante. Instrumento imponente, de chamar
gado e gente, cortava com sua nota dissonante vales e serras, anunciando
a novidade daquela manhã.
O vaqueiro, que em outros tempos ficara desolado
com a súbita partida do menino, vítima de um boi sem
coração, via agora a sua vida se esvair. O tempo,
implacável, levava as forças daquele corpanzil que
conduziu boiadas mil pelo nosso Brasil, somando-se mais uma cruz
à do menino no antigo estradão.
Olhando perdido para todos os lados, já
confuso entre os portões da vida e da morte, o velho boiadeiro
somente consegue distinguir no dourado do horizonte o som daquele
berrante que ele jurara jamais tocar novamente. Som que ele há
muito não ouvia e que lhe trazia no coração
as lembranças do menino tão trigueiro, que abria a
porteira para a sua boiada passar.
À medida que o som se aproximava, via
surgir um pequeno jovem de cor de ébano, cavalgando bela
montaria, tocando berrante em meio de uma imensa boiada. O vaqueiro,
em um misto de alegria e de espanto, pergunta com sua voz de trovão
ao jovem anjo:
“- Quem é você, que como
eu conduz o gado? Por que toca esse berrante que jurei jamais tocar?”
O menino apeia do cavalo, tira o seu chapéu
para cumprimentar o boiadeiro. De seu bolso, tira uma moeda, entrega
ao boiadeiro, juntamente com seu berrante.
“- Boiadeiro, que Deus vá lhe
acompanhando! Eu sou aquele menino da porteira e estou aqui para
recebê-lo, nas portas do país da luz. Seja bem-vindo!
Siga agora para amealhar outros rebanhos, para tocar outra vez com
fé o seu berrante...”
E com as mãos firmes, apagada da memória
a cruzinha do estradão, o boiadeiro toma de novo o seu berrante,
que prometera jamais tocar, e, com novo ar em seus pulmões,
corta com sua nota dissonante vales e serras, anunciando a novidade
daquela manhã:
Túu-Túu-Túuu.