Em 9.12.68, o cantor e compositor
Chico Buarque – ao se defrontar com a polêmica pelo fato
de ele fazer samba, o que seria para a época um ritmo ultrapassado,
em relação às inovações, como o
movimento da Tropicália – escreveu um artigo no periódico
“Última hora”, que termina com uma frase de sua
autoria que se tornou consagrada, sintetizando o seu pensamento sobre
a questão: nem toda loucura é genial, como nem toda
lucidez é velha.
Passados mais de 40 anos, a genialidade
e a lucidez desta frase nos remetem ao assunto desse artigo, visando
ao público jovem. De onde vem essa ideia de que por sermos
jovens temos que fazer loucuras? Parece-nos que existe uma cota, um
número mínimo e máximo de loucuras e inconsequências
que devemos efetuar na nossa juventude, para que esta seja vivida
em plenitude... Pois quando ficarmos velhos e caretas, teremos que
desempenhar aqueles papéis chatos e sérios, tendo que
encarar o batente como cordeirinhos. Uma grande tentativa de compensação,
então!
Ora, crer nisso dentro do contexto
da realidade espírita é ignorar a finalidade de nossa
passagem pelo Planeta Terra e as questões ligadas à
nossa evolução espiritual no momento da juventude. Ah,
é bem verdade, quando jovens temos o nosso processo de autoafirmação,
de construção da nossa identidade no contexto social,
de busca de caminhos. E isso nos demanda uma certa dose, diria até
natural, de contestação. Mas, daí, para vivermos
uma ciranda de loucuras..., muito distante.
Digo isso, pois vejo as consequências
funestas dessa ideia nos noticiários e no cotidiano. Vários
jovens ferindo-se ou perdendo a vida nos famosos “rachas”
com automóveis, nas guerras de “gangues”, no uso
e abuso de álcool e de drogas ilícitas, nos esportes
de altíssimo risco sem supervisão profissional, entre
outras loucuras geniais.
Toda essa aventura, essa loucura que
inunda as veias de adrenalina, traz em si uma dose de risco que nos
permite qualificá-las como situações que beiram
o suicídio. Ninguém enxerga a genialidade de descobrir
novos conhecimentos, ajudar ao próximo, lutar pelas questões
sociais, engajar-se na causa ecológica. Vemos o novo e genial
apenas nas loucuras!
Seria prudência uma coisa dos
mais velhos? Seria se preocupar com a sua integridade física
uma caretice? Lucidez é monótona? Genial é se
arriscar e acabar com a sua vida? Esses questionamentos são
interessantes para a mente juvenil, por vezes seduzida por essas ideias,
como quem busca sorver a vida em um único gole.
A vida como Espírito encarnado
tem suas riquezas e suas dores, nos seus vários momentos. Na
infância e na madureza, na adolescência e na velhice,
cada época tem seus frutos e seus dissabores. A vida é
isso, essa trajetória, esse caminho cujas preocupações
oscilam entre o passado, o presente e o futuro. Entre o individual
e o coletivo. Não podemos esquecer o que fomos, nem desprezar
o que queremos ser. Porém, o presente é a hora de fazer
e acontecer.
Na espiritualidade, bilhões
de Espíritos se amontoam na busca da oportunidade da reencarnação,
na ânsia de aprender a amar, de resgatar as suas dívidas
e de crescer, nos ditames da Lei maior. O que pensam esses Espíritos
quando veem a vida sendo desperdiçada assim? Será que
eles acham isso tudo genial?